segunda-feira, 9 de abril de 2012

Pega na mentira



Por: Chico Viana

É instigante procurar uma explicação sobre o porquê de o senador Sarney manter um inegável prestígio eleitoral durante décadas no Maranhão, tido e havido, como o dono e protetor deste Estado, senhor feudal de um feudo miserável que o tinha, pelo menos aos olhos distantes, como um político incensado e querido pelo seu povo.

Das posições políticas, dos métodos, da arte de se manter sempre no poder qualquer que fosse a natureza deste, sempre servindo aos seus propósitos, o Brasil inteiro sabia.

Só que o que dizia fora aqui não chegava e o que se passava aqui, fora não ia.

Mesmo hoje, não muitos sabem das posições tomadas pelo ex-presidente ao longo de sua vida pública, expressa em afirmações, muitas assombrosas, que nunca admitiria que as proferiu, se cotejado com sua postura na província.

Ferido uma vez quando teve que procurar outro estado para permanecer na vida pública, abatido moralmente, virou senador do Amapá. Mesmo mantendo o mandonismo em nossa terra, o fato é que a verdade escamoteada veio à tona, reforçando ainda mais o que os maranhenses pouco sabiam, e que, na época, com a repercussão da derrota, o Brasil soube mais: o Sarney que o Brasil conhecia, finalmente os maranhenses começaram a tomar conhecimento.

Vamos lá então, entre o que foi dito lá e o que foi dito cá pelo Dono do Mar.

Do que foi dito aqui, basta que fiquemos com a afirmação em sua posse ao governo do Estado em 1966: “Chegamos ao poder dispostos a subverter a desordem que campeia em tão miserável quadro. Quarenta anos depois continuamos o Estado mais miserável do Brasil. Lá fora poucos sabiam, aqui a gente sofre a verdade. Exagero? O então governador de Moacyr Andrade, ajudou convencer o povo de Alagoas a eleger Collor, em 1989, com o seguinte argumento: Alagoas tem que ser para Collor o que o Maranhão foi para Sarney.

Mas voltemos a biografia do Sarney por suas próprias palavras.

Em 1971, o democrata afirmou alto e bom som, assumindo a ditadura: “O AI-5 é uma transição imposta pela necessidade da defesa de valores maiores”. A coisa estava preta e não convinha arriscar, mesmo que fosse para sacramentar a maior abominação da história do país, a lei que autorizou o fechamento do congresso, legalizou tortura e mortes horríveis, acabou com todas as liberdades, colocou os cidadãos brasileiros num grande campo de concentração nazifascista. Chancelado pelo Sarney

Tanto que quando Geisel, que havia anunciado a famosa distensão lenta e gradual, cassou um deputado Wilson Campos que havia sido absolvido pelo Congresso, justificou como porta voz do amo da vez: “a distensão vai fazer uma pausa para reavaliação”. E havia votado contra a cassação.

Em 1979 quando os exilados começaram a regressar ao país, temerosos, pois ainda vigia a arbítrio, perguntaram-lhe sobre a segurança dos que se arriscavam, especificamente sobre o “irmão do Henfil” da música o Bêbado e o Equilibrista. Disse o então presidente da Arena: “Entre minhas atribuições como Presidente da Arena, não se inclui a de profetizar o que pode acontecer com o retorno deles”.

Já começando a fazer água no barco, em 1980, precatou-se: “Não é o partido”, – o PDS do qual já era presidente -, que é do governo, mas o governo que é do partido”. Trocadilho infame em que a emenda saiu pior que o soneto. Ou seja, o partido do qual era presidente assumia plenamente o governo ditatorial e seus atos.

Nesse mesmo ano, considerou a visita do Papa João Paulo II incômoda, afinal o Pontífice pregava justamente tudo o que a ditadura tinha feito e continuava fazendo e o senador era o Presidente do Partido que havia assumido as mazelas do governo: E disse: “Todos estaremos melhores quando o Papa tiver embarcado de volta a Roma”.

Será que alguém no Maranhão sabe que, no auge da campanha das diretas, o senador Sarney saiu-se com esta pérola? “O partido não se suicidará como Tim Jones, aprovando a volta das eleições diretas para Presidente”. Pois disse.

Depois que o plano cruzado naufragou, e os fiscais do Sarney e que Henfil sugeriu que o “botton” deveria ser substituído de eu Sou fiscal do Sarney por eu sou Agiota do Sarney, e ele que fomentou uma inflação de 80% ao mês, pregava “Vamos dar combate à inflação cortando centavo por centavo”. Em 1987, utilizou a estratégia de vítima: “Não me perdoam por ter chegado ao Governo em cima do cadáver de Tancredo Neves”. Coitadinho.

O povo sofrendo na rua e ele não se dava por achado: “Para não termos sangue e lágrimas, tem que haver suor e sacrifícios”. Dele é que não era.

No mesmo ano, sempre vaidoso, quando o ônibus em que estava com uma comitiva foi apedrejado no Rio, afirmou folgazão: “O povo não está com raiva de mim, está com raiva do ônibus”. Tá certo…

Em 88, cobrado por algum incauto sobre suas origens e o rumo arbitrário que o governo estava tomando, justificou: “O governo está indo para a direita por causa da esquerda”.

E diante da baderna generalizada que marcou o fim do seu governo, teve um rasgo de humildade, mas não queria afundar só: “Vamos admitir que o culpado seja eu, quem são os inocentes?”. O povo, inocentes e vítimas, cara pálida.

Mas o homem não se dava mesmo por vencido. No mesmo ano, na esteira da prorrogação dos mandatos, proclamava: “Não tenho ambição nenhuma pelo poder”. Irritado, Lula sugeria que ele, se quisesse o cargo fosse disputá-lo no voto e arrematava: “Tenho certeza que seus votos não vão dar para encher um penico”. Hoje são unha e carne.

Na campanha contra Lula, Collor foi forte: “O senhor é um político de segunda classe que pegou carona na história”, referindo-se a Sarney no horário eleitoral. Eleito, não é que Collor recebeu a visita de Sarney que, pesaroso foi lhe profetizar: “O senhor será o que eu fui, da mesma forma que fui o senhor será”. E foi. Mas quando a coisa virou contra Collor o “impeachment” praticamente decidido, já sem nenhum risco de retaliação, transformou-se e foi testemunha de sua profecia realizada: “Fernando Collor será expulso da história pelo comportamento sórdido com que mancha a vida Republicana”. Acertou na mosca.

Querem mais?

Bom esta pesquisa parou em 1994.

Ainda tem muito mais, fica para outro dia.

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